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Cifose de Scheuermann

Introdução

A variação normal para a cifose torácica adulta medida pelos ângulos de Cobb numa radiografia de perfil, segundo a Scoliosis Research Society, é definida como sendo de 20 a 40º e a lordose lombar de 30 a 60 º, sendo que a junção toracolombar deve ser neutra (10). Os ápices das curvas normais ficam em T6-T7 e L3-L4 respectivamente. As curvas começam a se desenvolverem quando a postura ereta é assumida, crescendo gradualmente até atingir seus valores definitivos durante os períodos de crescimento juvenil e adolescente.
Várias são as causas de cifose aumentada da coluna vertebral. As cifoses podem ser flexíveis, como na postural e compensatória, ou fixas, como nas formas congênita, inflamatória, neuromuscular, tumoral, pós-traumática, entre outras. Aqui, será abordada a de maior interesse, a doença de Scheuermann.

Definição

Scheuermann, radiologista dinamarquês, descreveu em 1920 a cifose torácica ou toracolombar rígida. Trata-se de uma cifose seqüencial da coluna vertebral, com encunhamento de corpos vertebrais. A cifose postural se diferencia desta doença pela forma uniformemente arredondada não-estrutural e pela a ausência de encunhamento dos corpos vertebrais e degeneração discal.
O início da doença de Scheuermann geralmente ocorre logo antes da puberdade, depois da ossificação do anel apofisário.  A condição é caracterizada pelo encunhamento dos corpos vertebrais, irregularidade das placas terminais, crescimento vertebral anterior diminuído e degeneração discal precoce (FIGURA 372).


A cifose de Scheuermann pode ser uma forma típica e outra atípica. A forma típica geralmente é torácica, com história natural mais previsível, apresentando por definição três ou mais vértebras consecutivas com encunhamento de 5 ou mais graus cada, levando a cifose estruturada. A forma atípica, três vezes menos comum, localiza-se na coluna toracolombar ou lombar, apresentando alterações das placas vertebrais, estreitamento dos espaços discais e nódulos de Schmorl anteriores, sem necessariamente ter encunhamento dos corpos vertebrais de 5 º.

Epidemiologia

A incidência relatada na população geral varia de 1 a 8 % na literatura, valor que deve ser subestimado devido à atribuição à má postura ou não-diagnóstico. A preferência por sexo varia na literatura, no geral sendo aproximadamente igual entre homens e mulheres.

Etiologia

Vários fatores etiológicos têm sido propostos, mas a verdadeira causa da Doença de Scheuermann permanece desconhecida. Estudos demonstraram uma predileção familiar, com hereditariedade calculada em 74% em um trabalho feito com gêmeos dinamarqueses, indicando o fator genético como causa importante e à frente dos fatores ambientais.
O fator mecânico, relacionado à postura ereta e ao princípio de Hueter-Volkmann, com forças de compressão maiores na porção anterior da placa de crescimento, é proposto como uma das causas mais aceitas. Achados histológicos de alterações da calcificação endocondral nas vértebras em crescimento, semelhantes aos da doença de Blount, dão suporte a essa teoria, assim como a observação da reversão destes achados como uso de órteses ou gesso no paciente com coluna imatura.
Outras teorias envolvendo distúrbios da circulação sanguínea normal, alterações do colágeno, herniação discal, e fatores hormonais, foram descritas. É provável que a causa da Doença de Scheuermann seja mesmo multifatorial.

História Natural

Poucos estudos de acompanhamento a longo prazo em pacientes com cifose de Scheuermann não tratada existem na literatura. A história natural da doença tende a ser benigna, com os portadores adultos apresentando um pouco mais frequentemente que o resto da população dor, preocupações estéticas e procura por trabalhos menos exigentes fisicamente. Em geral os pacientes não sofrem restrições cotidianas sérias e tem poucos problemas clínicos ou funcionais.
Pacientes com cifose superior a 100º apresentam restrição da função pulmonar. Relatos de caso relacionam, como secundários à cifose de Scheuermann não tratada, cistos durais e herniação discal torácica. Em comparação com grupo controle, pacientes com cifose de Scheuermann têm cinco vezes mais chance de apresentar degeneração discal.
Novos estudos ainda são necessários para esclarecer a história natural desta doença em indivíduos com diferentes magnitudes de curva cifótica, em especial na faixa dos 70 a 90º.
Escoliose leve, de 10 a 20 º, geralmente de evolução benigna está presente em cerca de um terço dos pacientes com doença de Scheuermann. Espondilólise lombar associada, também é um achado freqüente (cerca de 50% dos pacientes), atribuída à sobrecarga da pars por hiperlordose lombar compensatória.

Apresentação Clínica

A idade do início da doença é difícil de se estabelecer. A detecção clínica ocorre por volta dos 10 a 12 anos de idade, com a ossificação da apófise do anel de crescimento e evidencia radiográfica da doença. Geralmente os pais buscam o médico preocupados com a má postura, ou o paciente apresenta a queixa de dor localizada sobre a área cifótica ou a coluna lombar inferior. A dor geralmente cede após o término do crescimento, ou prevalece na região lombar devido à hiperlordose local compensatória.
Pacientes com a doença de Scheuermann lombar geralmente não têm uma cifose perceptível e queixam dor na porção inferior das costas associada aos movimentos. Esta forma é mais comum em indivíduos do sexo masculino envolvidos em atividades físicas freqüentes.
Ao exame físico pode-se perceber cifose aumentada e rígida no segmento acometido, encurvamento anterior dos ombros, aumento da lordose cervical e lombar compensatório e freqüente encurtamento dos músculos isquiotibiais e iliopsoas. Não é comum o acometimento neurológico.

O exame radiográfico normal, traçando-se o ângulo de Cobb nas vértebras torácicas mais craniais e caudais, mostra uma cifose de 20 a 40º no perfil. O critério para diagnóstico da cifose de Scheuermann é mais de 5º e encunhamento de pelo menos três vértebras adjacentes. As placas vertebrais estão irregulares e os espaços dos discos estreitados. Frequentemente nota-se a presença de nódulos de Schmorl. Para se determinar a flexibilidade da deformidade é feita uma radiografia em perfil com o paciente em decúbito dorsal sobre um suporte almofadado no ápice da deformidade. O equilíbrio sagital é calculado radiograficamente traçando-se uma linha de prumo do centro do corpo de C7 e medindo-se a distância desta ao promontório sacral. Os valores normais são de +2 a -2 cm. Tomografia computadorizada e ressonância magnética só são necessárias se o paciente apresentar sintomas neurológicos ou achados incomuns. A radiografia em AP é feita para avaliação de escoliose ou anomalias vertebrais associadas e estimar a maturidade esquelética pelo método de Risser.

Tratamento

A observação ativa, com consultas regulares e radiografias a cada 6 meses, pode ser indicada em pacientes com cifose leve e não progressiva. A Fisioterapia tem eficácia significativa no tratamento da dor relacionada à cifose de Scheuermann e teoricamente pode melhorar o tônus muscular, corrigir a má postura e hiperlordose lombar, aumentar a flexibilidade da coluna e alongar os músculos peitorais e isquiotibiais encurtados.
As indicações e eficácia do tratamento com uso de órtese, em geral o colete de Milwaukee (FIGURA 374), é variável na literatura. Parece haver certo consenso em tratar desta maneira apenas cifoses flexíveis em pelo menos 40%, em pacientes que não atingiram a maturidade esquelética e em cifoses de 50 a 70 º.
Curvas acima de 74 graus ou com importante acunhamento respondem pouco ou nada ao uso do colete. Os protocolos de uso variam indicando-se o uso em tempo integral por 12 a 18 meses, seguido de uso intermitente até a maturidade esquelética, ou o uso em tempo integral até a maturidade. Normalmente ocorre alguma perda da correção obtida com o colete após a descontinuidade do uso, mas o ganho de correção ainda assim é positivo em 6º em relação à deformidade inicial. No entanto, alguns pacientes podem não ganhar qualquer correção, ou até mesmo evoluir com o aumento da deformidade, sendo que a literatura atual não permite predizer o resultado deste tratamento em qualquer paciente que apresente a cifose de Scheuermann.
O tratamento cirúrgico parece ser a única forma de melhorar significativamente a deformidade cifótica da doença de Scheuermann. As indicações para o seu uso, no entanto, estão mal definidas, considerando-se as incertezas na evolução natural da doença com os dados atuais da literatura. A opção pela cirurgia deve ser tomada conjuntamente pelo médico e pelo paciente baseada não só no grau e na flexibilidade da deformidade, mas também em componentes subjetivos de dor, percepção própria e outros sintomas. De uma forma geral, a cirurgia é indicada em adolescentes quando a curva é superior a 75 graus que não responderam ao tratamento com o colete ou se os sintomas dolorosos justificam. A cirurgia ainda pode ser indicada no adulto com 60 graus de cifose, com sintomas importantes ou com deformidade estética inaceitável para o paciente.
A correção cirúrgica pode utilizar a abordagem posterior, anterior ou combinada. A abordagem combinada é mais recomendada e confiável, mas é possível que a abordagem posterior isolada com o uso de parafusos pediculares ofereça melhor fixação, com menores riscos de complicações pós-operatórias. O procedimento via posterior exclusivo pode ser considerado em uma cifose que puder ser mantida a menos de 50º (FIGURA 79, FIGURA 78).

Alguns autores utilizam como critério para abordagem anterior com release a existência ou não de flexibilidade. Vários são os instrumentais utilizados descritos na literatura (ganchos, parafusos, fios, hastes de compressão), variando de acordo com o autor. Porém, alguns detalhes técnicos devem ser observados independentemente do material utilizado. A instrumentação e fusão devem atingir a vértebra proximal da cifose até a altura do primeiro disco lordótico distal. Não se deve hipercorrigir a deformidade para que se evite cifose juncional proximal. A cifose final deve ser maior que 40 º e a correção não deve ultrapassar 50% da cifose inicial.

Cifose de Scheuermann
Dr. Lucas Boechat
Dr.Jefferson Soares Leal
23/10/2007
 
Atualizado em 24/01/2009

 

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